Giovana Cristina Bastos: Caranguejo (2024)

Giovana Cristina Bastos é paulistana de 2000. Através da palavra, tenta ressignificar toda sua genealogia, unindo memória, presente e futuro. Participou da antologia “Cartografias – vol. 1: contos de autoras brasileiras” (2022) com o conto “Água Doce”, publicou a plaquete “Axolote” (2023) e”Caranguejo” em 2024, todos pela Editora Primata.

foto: Marê Mongelos

Os poemas a seguir foram selecionados do livro “Caranguejo” (Primata, 2024), disponível para compra neste link.



DIVÃ COM MINHA BISAVÓ E OYÁ

Homem, mato e reduzo a barro,
com minha mão e meu braço
belo e forte, torneado.

E depois banho as crianças,
impávida,
sem mágoa.

Liberdade,
no futuro, anglicismo
e uma carteira de trabalho: no fear,
sem medo, no fear.

Revés do açoite, cigana,
mulher que é lâmina,
sol nascente,
costela do impotente.

Viro do avesso uma víscera
e danço.

Penteio e tranço
as coroas crespas
das mulheres banto.



FALSA CANTIGA DE ESCÁRNIO

Raio solar
não sou fogo-fátuo
simples, incendiário:
reluzo, relampeio,
aqueço e sobressalto.

Mas veja,
pequenas sinhás encantadas,
estrelas – latão, não prata
nem ouro da mina,
minério que o valha,

mil cores e rendas
lenços de seda,
que pena!

Não têm minha graça.


BARÁ

Bicho noturno, testemunho
dejeto, detrito,
cidade de rato no cano do esgoto,
homem-rato em cidade de lixo.

No ar, perfume e sanha,
o vulto na esquina,
o córrego, a cobiça.

A fé engole o grito,
o pé saltita e dança,
ginga e corta a rota
surpreende
encruzilhada,
onde os antigos
por trás das costas
murmuram prece
e jogam cachaça.

Tropeço e sigo,
ouvindo ao longe
o cantar dos grilos.

Primata