Sergio Mello: Puma (2018)

Sergio Mello nasceu em São Paulo, em 1977. É autor de No Banheiro um Espelho Trincado (Ciência do Acidente, 2004), Inimigo em Testamento (Soul Kitchen Books, 2013) e Puma (Corsário-Satã, 2018). Além de poeta, é roteirista e dramaturgo.




Os poemas a seguir foram selecionados do livro Puma (Corsário-Satã, 2018).


PADARIA POLÍCIA


hora da pele
cujo entorno
é quase vegetal a manhã

muro de nata
ao planetário de traumas
diadema da íris

pé avelado
que desperta o gramado leste
entre o sumo e a gávea

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Francesca Angiolillo: Etiópia (2017)

Francesca Angiolillo (Niterói, 1972) é arquiteta, jornalista e tradutora. Em 2017, estreou na poesia com dois volumes editados pela 7Letras, Rua Lisboa, que saiu na coleção Megamíni, e Etiópia, vencedor do Prêmio Alphonsus de Guimaraens da Biblioteca Nacional em 2018.




Os poemas a seguir foram selecionados de Etiópia (7Letras, 2017).




ETIÓPIA, ETIÓPIA


Etiopía era a estação
de metrô da minha casa
quando eu me mudei daqui –
você logo
se lembrou
da Etiópia.
A estação de metrô tinha
uma cabeça de leão
como emblema
a sua Etiópia tinha
um filhote de chacal e
um imperador
segurando o filhote de animal
uma pedra no anel
no dedo do imperador
sobre a cabeça do filhote
– nela brilhava o sol.
O fascismo que você
deplorou do alto
de seus oito anos
na fila do leite
porque leite não havia
ergueu cidades
na Etiópia.
(No ano em que você nasceu
o imperador foi eleito
homem do ano
da Time Magazine;
depois disso
bem depois um tanto depois de
nascida eu
outras crianças passaram fome
sem direito a fila
no vale do rio Omo.)
Nunca soube das cidades
que você não ergueu
nas terras de Afar
onde Lucy nossa mãe
até hoje está
mas sei da pedra do anel
no dedo de
Haile
Selassie
como se eu estivesse lá
como se eu fosse você.

Sua Etiópia hoje é
uma fotografia
– nela você aparece
cercado de gente
negra pintada –
guardada
numa caixa
de papelão.


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Roberto Piva: Coxas (1979)

Roberto Piva (1937-210) é autor da plaquete Ode a Fernando Pessoa (Massao Ohno, 1961) e dos livros Paranóia (Massao Ohno, 1963), Piazzas (Massao Ohno, 1964), Abra os olhos e diga ah! (Massao Ohno, 1975), Coxas (Feira de Poesia, 1979), 20 Poemas com Brócoli ((Massao Ohno, 1981), Quizumba (Global, 1983) e Ciclones (Nankin, 1997), reunidos em três volumes pela editora Globo, sendo o último – Estranhos Sinais de Saturno – acompanhado de poemas inéditos. Marcada pelo experimentalismo, múltiplos diálogos e alta qualidade das imagens poéticas, sua obra é uma das mais intensas da poesia brasileira contemporânea.




Os poemas a seguir foram selecionados de Coxas (Feira de Poesia, 1979, quarto livro do poeta. Confira as postagems sobre suas outras obras neste endereço.




SBORNIA FILAMENTOSA


O pitecantropus as cidades gregas as doces cobaias
requentadas & comidas nas favelas o divã da histeria
relembrando sonhos tribais fuxico do chefe sandálias
desafiveladas na casa das máquinas o prédio é de Maria-
Mole onde roncam cascavéis humanas minha mão é deus
passo decisivo para el tránsito del mono al hombre
miniatura da linguagem ruborizada Macunaíma-Pop
aventais de luxo balançam nos varais de Cobra Norato
Panis angelicus você sabia que Simão o Caolho vem para
jantar? por que não o bispo de Berlim? a cicuta é grátis o
corvo nada entende de política o jaburu come picadinho &
tira a bengala do ar igapós sonham com coalhada a menina
ficou atrapalhada na casa das máquinas tenebroso
impeachment do caos Engels de turbante & su Dialectica de
la Naturaleza (que Polén leu chapado nas montanhas de
Atibaia) cantando um agente da CIA de chuteiras
cidades de metal precário um quimono para o Príncipe das
Trevas dos ovos saltaram duas anãs obscenas que acenaram
lenços alaranjados & partiram para sempre em direção à
curva de nível. Deus é quimbandeiro.




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Glauco Mattoso: Graphophobia (2018)

Glauco Mattoso, academicamente estudado como um caso “queer” de poeta satyrico e fescennino, é auctor de mais de cinco mil sonnettos e mais de cincoenta livros de poesia, alem de ficção e ensaio, de um tractado de versificação e de um diccionario orthographico, este systematizando sua reacção esthetica às reformas cacophoneticas soffridas pelo portuguez escripto. Paulistano de 1951, perdeu a visão nos annos 1990 devido a um glaucoma congenito que lhe ensejou o pseudonymo litterario. Sua producção mais volumosa occorre apoz a cegueira, graças a um computador fallante.




Os poemas a seguir foram selecionados do livro Graphophobia (Patuá, 2018).




BATHOPHOBIA


A cegueira nos illude:
mesmo em casa, me appavora,
não havendo quem me adjude,
caminhar, confesso agora.

Sempre assumo uma attitude
precavida: si estou fora,
temo o piso, arisco e rude;
si estou dentro, o que me escora.

Sensação tenho de estar,
sem appoio, em mau local
ou suspenso, num logar
escurissimo e abyssal!

Como, em sonho, a gente pisa
num boeiro ou lodaçal,
num buraco e affunda, bisa,
accordado: é tudo egual!


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Leonardo Chagas: Cosmos / Cacos (2018)

Leonardo Chagas é um poeta paulista. Transita diariamente sobre as linhas férreas desde as margens do rio Juquery às margens do rio Tietê. Disseminador da poética paranóica Beat-Surreal, lança seu primeiro livro Cosmos/ Cacos em 2018 aos 22 anos sob o signo do Cão.


foto: João Gabriel Villar da Cruz

Os poemas a seguir foram selecionados do seu livro de estreia Cosmos/ Cacos (Editora Primata, 2018), que acompanha também ilustrações de Lorena Romão.


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CANÇÃO DA EXPERIÊNCIA



a cidade do inverso 
o avesso do agouro 
o cansaço do verso 
o apelo, o abandono 

o sagrado, a sangria 
o castiço cachorro 
a Camisa de Vênus 
o perfume do Touro 

as libras do vento 
a virgem de ouro 
retiram do tygre 
o cordeiro tolo 

desfeitos os nós 


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