Anderson Lucarezi (São Paulo, 1987) é escritor, professor e tradutor. Publicou Réquiem (Ed. Patuá, 2012), livro vencedor do Programa Nascente USP 2011, e Constelário (Ed. Patuá, 2016). Como tradutor, dedica-se a trazer para o português as obras de poetas norte-americanos como Hart Crane, Jerome Rothenberg, John Gould Fletcher, entre outros. Faz, atualmente, mestrado em Letras Estrangeiras e Tradução na Universidade de São Paulo.
Os poemas a seguir foram selecionados da obra Constelário (Ed. Patuá, 2016).
.
sequer o céu é sincero:
a estrela que cintila
não é a estrela que cintila,
visto que, na real,
imagem antiga.
o escuro que anoitece
não é o escuro que anoitece,
visto que, de onde vem,
já se fez brilho.
iria, eu, de volta,
fosse aceito,
a um céu do presente
em que uma estrela extrapolasse
ser mera brasa enganosa:
talvez, quem dera, farol
(visto que agora é lanterna traseira)
de um carro-tempo mais-que-perfeito.
.
do planeta Vênus a oscilar por trás das nuvens,
um jorro de sinapses:
o veludo dos amores-perfeitos de Ushuaia,
beleza frágil sob a lâmina do vento;
também, grandeza a la Gigante Adamastor,
a imponência dos Andes noturnos em sítio a
[ Águas Calientes;
A tenra tez da palavra durazno
também,
no compasso do impacto de um leão-marinho morto à rambla de Montevideo
e do gosto de sal de um grão de Uyuni;
Tais referências, o que em comum?
a saber: talho fundo em corpo raso,
inúteis signos de viagem, olha,
aquela estrela a sumir, vencida
pelo sol nascente, estela-
símbolo deste ciente, e logo
eu, dono de pouca sombra no chão?
.
no pavor das coisas devoradas vivas,
corações ainda palpitantes pós-mordida,
as estrelas – carne tenra –
corroídas por sucos gástricos
deste estômago trevoso de baleia.
Um espetáculo