Susanna Busato: Moldura de Lagartas (2020)

Susanna Busato é poeta e professora de poesia brasileira (Unesp). Autora dos livros de poemas Corpos em Cena (Ed. Patuá, 2013),  finalista do 56º Prêmio Jabuti, em 2014 e Moldura de Lagartas (Selo Demônio Negro, 2020). Publicou a plaquete Papel de Riscos, pelo Centro Cultural São Paulo, em 2013. Ganhadora do Mapa Cultural Paulista, categoria Poesia, em 2010. Tem poemas publicados em vários sites e revistas de poesia e literatura. Participou da Mostra “Poesia Agora” no Museu da Língua Portuguesa (2015), na Caixa Cultural do Rio de Janeiro (2017) e na Caixa Cultural de Salvador (2017). Como declamadora, participou do Recital Multitudo Haroldo de Campos, no Itaú Cultural (2011), em São Paulo e do Recital Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros (homenagem a Oswald de Andrade), na FLIP em Paraty (2012), com patrocínio do Itaú Cultural.



Os poemas a seguir foram selecionados do livro Moldura de Lagartas (Selo Demônio Negro, 2020).




CANTIGA DE ESPERA



A saudade boa ressoa
como uma vontade louca
como uma sede
lambida no rosto
do tempo deposto.
A saudade costura
a palavra ainda crua
como um dardo na mente
a fustigar a espera
lenta
do encontro
nascente.


LAGARTA SENDO


Uma lagarta atenta passa
a maior parte do tempo
casta enquanto tece a capa
do momento outro: nódulo.

Larva transmutada.
Um quase nada de um tecido tácito: óvulo.
Metamorfose intacta de lagarta trans-
formada em bolha: folha
de papel-palavra.

Quando uma lagarta sonha
sonha um tecido de franjas:
frágeis folhas de caderno
entre outras tantas finas
folhas de papel de seda.

Fraturas lascas lâminas:
ágeis lembranças sonham
a aspereza –
letras pretas
sobre asas brancas.

Uma lagarta quando sonha
sonha a saliva solta e sulca
na tela entumecida a sina
de ser palavra livre
ali
ond
eno
cas
ulo
é
ond
a



ENTRE


Dos limites conheço
as bordas
os prefácios
os precipícios
as altas ondas
as orelhas
as quinas pontiagudas
das facas
estiletes
de ar.

Dos medos conheço
a falta
a culpa
a partida
a solidão
de uma janela aberta sobre a noite
a mudez
de uma parede depois de trancada a porta
a página aberta
a palavra alerta
a luz branca
a testa estanque
na ruga rente
a dividir o corpo
antes e depois
da sede.


CILADA


Poema de pavio
Curto
Poema de rabo
Longo
Um explode
No espaço
Outro expira
De longe
Poema curto
Tarja preta
Poema longo
Homeopático
Um te engole inteiro
O
ou
tro
ao
s
bo
ca
do
s


COM O FOLE NA GARGANTA


1.
na garganta entumecida
o ar se aninha
ave louca
ave gorda
ave que
não para de
respirar

2.
da garganta entumecida
um ar de asas se avizinha
ave louca
presa às grades
dos pulmões
de ar

3.
com a garganta entumecida
falo em boca
distraída
o mais não grita
engole
aflita
a sua
sina




Primata

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