André Bonfim é poeta, ator, callejero profissional, vocalista da banda de blues & rock Velhos Abutres & professor de filosofia. Nasceu em agosto de 1984 em Fortaleza-CE. Fez graduação & mestrado em Filosofia pela Universidade Federal do Ceará – UFC entre os anos de 2003 a 2007. Depois migrou para o sul & em 2013 concluiu um doutorado em Filosofia pela PUCRS, em Porto Alegre-RS. Tem poemas publicados em revistas & sites de poesia & literatura em geral. É tutor de dois gatos & anda a pé.
O ATACAMA EM MINHA PELE
os vales da morte & da lua
os desfiladeros callejeros
& ao longe um vulcão
todos tingem minha retina
tenho milhas carimbadas
em minha identidade velha
que se desfolha como um abacaxi
evoé, calles de san pedro!
peiote nas faces do alemão
com o cérebro em estado de graça
& berrando Lorca aos perritos callejeros
evoé, calles de san pedro!
peiote en las manos da chilena
vendendo cacos de vidro
& suplicando a diós por uma arte da fuga
evoé, calles de san pedro!
gracias por me despertar
de meu sono dogmático
& euclimondriano
(21:30 // 29.09.2016.)
MANHÃ
a manhã se desfolha na janela
se faz de lira ou algoz
suas raízes a noite engoliu
qual um quadro de Goya
kouros perdidos nas ruas
sátiros escorados nos muros
o vigilante apito ainda ecoa rapsódias nunca descobertas
anjos respiram
ebós são devorados
gatos olham o muro
mantras são suspensos
piso nas folhas secas da sala de minha casa
bosques, colinas, mata fechada?
honrados sejam os boletos
saciados no dia útil
talvez o troco pague a carona de Caronte
TEM ALGO
tem algo à espreita
(sabe-se lá o que ou quem)
as portas batem
as cortinas fecham
até os ratos pestanejam
sem fazer barulho
os sapatos adiantam a sombra
que se projeta no muro
puro a urina dos bêbados
que abençoam a cidade
nas madrugadas sem fim
sem nem saber porquê
tem algo que penetra
nos becos sem pressa
sem pedir silêncio
sem pedir barulho
sem pedir nada
engolindo tudo ao mesmo tempo
tem algo que dinamita a coluna da hora
não deixando milésimos de segundo
tem algo nas pontas de cigarro pisoteadas & marcadas de batom, nas sacolas plásticas cheias de cola de sapateiro, nos panfletos oferecendo exame odontológico de graça, nos carros de som pedindo a vasilha,
na palavra pregada aos berros e nas palavras, palavras,
palavras entre os dedos
tem algo à espreita disso tudo