Marcelo Torres: Poemas tímidos e gelatinosos (2019)

Marcelo Torres nasceu em Pernambuco na cidade de Palmares no ano de 1984. Reside em São Paulo na região do ABCD. Publicou Vertigem de Telhados, nadar em cima da rua, ambos livros de poemas editados em 2015 pela Kazuá. Em 2017 lançou Páthos de Fecundação e Silêncio livro de poemas editado pela Patuá. O autor ainda tem poemas publicados em antologias pelo Brasil, em revistas de literatura e cultura.



Os poema a seguir foram selecionados do livro Poemas tímidos e gelatinosos (Patuá, 2019)



SUPERMERCADOS SEM VENTO


Regulem direito a temperatura
os oceanos serão abocanhados
por peixes de inox
troca o dedo
para ter limite na direção
que tem estrangulado o azul
véu comestível
ferido
em costelas cheias
de trovoadas
percussivas
os bichos são hipnotizados
e
rastejo fazendo crescer seu nome
dentro da malícia
há uma criança tecida
pela técnica quase robótica
outra grudada a escravidão da foice
e
invernos
cheios de togas infernais
reivindicações
de um mundo
sem instintos
azafamado por humanas prateleiras



A NEGRA COM VIOLÃO


A negra O CE A N O
toca violão
encostada na banca de jornal
com a perna lesionada
mói automóveis
em decomposição
e
os para-brisas da indiferença
despertam a flor na esfera
onde facções cruas
ardem
no asfalto dilata
a retina da garoa
no busto de bronze
austeridade
no peitoral humano
pinta
o crepúsculo com o lixo
e
repousa
os meninos das chacinas
que não chegaram aos 25 anos de idade
no berço de sua Mãe-África
vive alterosa
nos semáforos de luto

BOCA SUADA FORA DO MUNDO


O tapa abriu uma fenda
no lábio
o grito
fora de si
aberto como dois gomos
de mexerica
abelha fônica
harpa de chumbo
travando o orgulho
pedaço de língua
amônia na saliva
o doutor acende
a lâmpada do firmamento
menina/estrada
no palato artesão
violência não visual
no palácio
tomate batido
no liquidificador
embuste de enxofre
entrevista
na frente da baderna
nascemos impetuosos
porque tudo está suado
fora do mundo
de mim/de você

PÁSSAROS NO ECLIPSE


O ar arrebentando
pássaros sem bicos
lustres diáfanos
no eclipse
canalizações
na rua da fome
plumas soltas
a esfera maior
é feita de vinho
no álcool
a cabeleira enfrenta
as vírgulas da morte
espingardas
de gelatina
esmagam macaxeiras
num jorro
mental
de paisagens
de asas
encharcadas
estamos a sós
na orelha quente do mapa
somos seres tangíveis
mas agora
as turbulências afastam
a alegria/teu nome composto de flores
vêm da sáfara
essa escuridão sem saída


Primata

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