Susanna Busato: Corpos em cena (2013)

Susanna Busato, autora do livro Corpos em cena (Editora Patuá, 2013), é uma gaivota paulistana. Filha dos anos 60, meio hippie nos anos 80, virou professora universitária nos anos 90 com a poesia na rota da vida. Durante os voos virou Mestre em Comunicação e Semiótica (PUC/SP) e Doutora em Letras (UNESP/São José do Rio Preto), onde fincou o bico como professora de Poesia Brasileira, e onde tem um grupo de estudos de poesia, o GEP/CNPq. Hoje se dedica a devorar nos lírios as serpentes que habitam seu corpo. Por isso traça roteiros pra tudo. Viaja dormindo, sonha acordada e realiza os desejos em voo rasante. Deixou seus rastros e pensamentos em várias revistas literárias e acadêmicas. Num dos voos, ganhou o Prêmio Mapa Cultural Paulista na fase estadual, Categoria Poesia, em 2010. O livro Corpos em cena foi finalista do Prêmio Jabuti 2014 e integra a Coleção Patuscada, premiada com o ProAC – Programa de Ação Cultural da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo.

 

 

 

HORIZONTE DE ESPELHOS

 

colunas e conchas
água clara
seios
o chão as curvas
de um sol navegam
sua ilha
clitoriana gruta
horizonte de espelhos
superfície ao reverso

 

 

 

PELE NUA

 

Porque a tua
mão segura
ruptura da pele
e agulha
patrulha e segue
a minha insondável
nervura.

E porque nunca
antes tocada
a pele segura
se rasga
no paraíso e grava
língua sede e saga.

 

 

ORALIDADES

 

entre lábios
inchados
a língua devora
o grito

oralidades
à luz
das grutas

estalactites
roçando
as curvas

na sua boca
todas
surtam

 

 

 

UM CASO DE AMOR

 

Asfalto fuga e fumaça
suas trilhas nefastas
perseguem as minhas
na prega da saia
no beijo do vento
na flor descoberta
vermelha no centro.

Cidade de azuis clandestinos
couraça de pó e cimento
me abraça como um noivo
e me lança viadutos adentro.

Me entontece nas curvas
me sussurra nos trilhos
encruzilhadas de amor eterno.

É assim que te espero
na volúpia pneumática das esquinas
inteira como as avenidas
da minha Paulista humana loucura.

 

 

A META FÍSICA DAS HORAS

 

Me lambem os ponteiros de dentro
como relógios.
O tempo se despe
pelos cotovelos
e ergue-se
clavícula
crânio
grave
sobre os pentelhos.
E os guindastes
na arcada da noite
arregalados
me devoram
como corvos.

 

 

SEMITONS

 

metade de mim evapora
a outra permanece
tua nódoa
perfume que retorna
fogo-fátuo
memória

 

 

 

 

Primata