Carlos Eduardo Marcos Bonfá

Carlos Eduardo Marcos Bonfá é graduado em Letras, mestre, doutor e pós-doutorando em Estudos Literários pela UNESP. Publicou artigos e textos literários em revistas acadêmicas, especializadas e virtuais, como A Cigarra, Desassossego e Desenredos. É colaborador da revista Mallarmargens e mantém o blog Beleza Intrusa (www.carloseduardobonfa.blogspot.com.br).

 

Carlos Eduardo Marcos Bonfá

 
 

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As folhas das árvores
Transdescendem o ritmo da chuva
Como
continuum cósmico
Tiritando na imanência
De algum olhar.
Silêncios também se incluem,
Empostam sua voz
Para dar sentido
À algaravia,
Antes úmida de saliva
Do que de chuva.
Mas o orvalho tudo confundirá,
E a lágrima tudo restituirá, talvez.
O olhar, algum olhar,
Vaza, teocríptico,
Uma luz serenada.

 
 

MALVÁCEO

 

O dedo apontando o céu
(Sendo picado por uma estrela,
Ferrão luminário)
Desviou a atenção da própria mucilagem
Anunciada na mitomania do hibisco,
Amaciada na pele já amaziada
Com o mel das abelhas
Que ritualizam aéreos gestos
De uma colmeia imaginária;
O imaginário que perfura o real
Como perfura a pele prenhe
De microfissuras como de dentes operados.
Meu dente é a caixa de Pandora,
Meu dente da frente,
Hiperinflação de imaginário pós-operatório
Querendo perfurar o real,
Relando nele como pincel de dentista,
Como broca de artista.
O hibisco, sonhando com seu próprio exotismo
Como um mimo,
Se transformou em rosa-de-sarom.

 
 

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No escuro, uma luz paraplégica,
Um brilho lento,
A agressividade de uma microcosmogonia
Suave resplende.
Mas nada se expande,
Só uma luz aqui, um brilho ali esplende;
Um lume meio nume que, parcimonioso,
Não se entende a não
Ser como uma parte
Menos escura da escuridão.

 
 

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Agora, com nossos deuses mortos,
Ou melhor, ausentes,
Podemos amar no poema.
Podemos dilacerá-lo,
Fazê-lo vibrar em todos
Seus recursos e procedimentos.
Agora, podemos compreender
Que o poema faz o amor,
E que tudo o que você sente
Já antes foi testado
Em alguma rima,
Métrica ou som motivado.

 
 

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O horizonte bruxuleia.
Um
coven de taturanas
Concilia cores fortes
Como queimaduras.
Conluio de fogo
Que esbraseia
O território verde
De misteriosa mata.

Primata

2 Comments

  1. A poesia de Carlos Eduardo é arrebatadora e irremediável. Imiscui-se no mundo do divino, trazendo para os pobres humanos alguma beleza e qualquer esperança ou constatação de sua enfermidade movediça. Impregna o chão de terra batido de bênçãos estelares. Só nos resta ficarmos encantados enquanto mastigamos suas palavras.

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