Lilian Sais é escritora e uma das fundadoras da plataforma de ensino Literartéria. Doutora em Letras e pesquisadora e tradutora da área de grego antigo, é paulistana de nascença e fumante assídua por opção. Leitora voraz da literatura brasileira contemporânea, gosta de samba, cerveja e poesia e é defensora da boemia, de piadas ruins e das conversas descompromissadas de mesa de bar. Os amigos dizem que é uma peste, mas que cozinha bem. Ela nega.
Os poemas a seguir foram selecionados da obra Passo imóvel (Editora Cozinha Experimental, 2018).
Roberto Piva (1937-210) é autor da plaquete Ode a Fernando Pessoa (Massao Ohno, 1961) e dos livros Paranóia (Massao Ohno, 1963), Piazzas (Massao Ohno, 1964), Abra os olhos e diga ah! (Massao Ohno, 1975), Coxas (Feira de Poesia, 1979), 20 Poemas com Brócoli ((Massao Ohno, 1981), Quizumba (Global, 1983) e Ciclones (Nankin, 1997), reunidos em três volumes pela editora Globo, sendo o último – Estranhos Sinais de Saturno – acompanhado de poemas inéditos. Marcada pelo experimentalismo, múltiplos diálogos e alta qualidade das imagens poéticas, sua obra é uma das mais intensas da poesia brasileira contemporânea.
foto: Claudio Willer
Os poemas a seguir foram selecionados de Piazzas (Massao Ohno, 1964), segundo livro do poeta. Confira a postagem sobre o Paranóia (Massao Ohno, 1963), seu livro de estreia, neste endereço.
PIAZZA I
Uma tarde
é suficiente para ficar louco
ou ir ao Museu ver Bosch
uma tarde de inverno
onde garòfani milk-shake e Claude
obcecado com anjos
ou vastos motores que giram com
uma graça seráfica
tocar o banjo da Lembrança
sem o amor encontrado provado sonhado
& longos viveiros municipais
sem procurar compreender
imaginar
a medula sem olhos
ou pássaros virgens
aconteceu que eu revi
a simples torre mortal do Sonho
não com dedos reais & cilíndricos
Du Barry Byron Marquesa de Santos
Swift Jarry com barulho
de sinos nas minhas noite de bárbaro
os carros de fogo
os trapézios de mercúrio
suas mãos escrevendo & pescando
ninfas escatológicas
pequenos canhões do sangue & os grandes olhos abertos
para algum milagre da Sorte
Tarso de Melo (Santo André, 1976) é poeta, autor de A lapso (1999), Carbono (2002), Planos de fuga e outros poemas (2005), Lugar algum (2007), Exames de rotina (2008) e Caderno inquieto (2012), reunidos atualmente no volume Poemas 1999-2014 (2015). Seus livros mais recentes são Íntimo desabrigo (2017) e, com Carlos Augusto Lima, Dois mil e quatrocentos quilômetros, aqui (2018). É também advogado e professor, doutor em Filosofia do Direito pela Universidade de São Paulo.
Os poemas a seguir foram selecionados do livro Íntimo desabrigo (Alpharrabio Edições e Dobradura Editorial, 2017).
TARDE
para o Pucheu, como um tow-in entre as palavras
O velho surfista diz
que sentir a onda nascendo
sob a água, ainda longe,
é como sentir pulsar
o coração da terra.
Aqui, sem mar, mergulho
nas ondas do asfalto,
conto as gotas de sangue
anônimas nas calçadas
Autora dos livros de poemas Gravidade (Patuá, 2018) e Chacharitas & gambuzinos (Patuá, 2015 – edição bilíngue), Ellen Maria Martins de Vasconcellos veio de Santos. Mestre em Letras na USP; hoje é doutoranda e trabalha como editora de livros didáticos e paradidáticos. Publicou poemas em diversas antologias e revistas impressas e digitais, nacionais e estrangeiras. Também é tradutora freelancer e seus trabalhos mais relevantes também são na área da poesia. É fanática pela literatura latino-americana, pelo cinema oriental e pela culinária do mundo todo. Acredita em fantasmas e desconfia dos vivos. Enxerga muito bem, mas às vezes fecha os olhos. Definitivamente, não tem o coração de pedra.
Portfólio e contato: ellenmartins.wixsite.com/home
Os poemas a seguir foram selecionados do seu livro Gravidade (Patuá, 2018).
GRAVIDADE
onde caem as maçãs
jaz a teoria
quanto pesa um corpo
quando ainda é
semente?
Wilson Alves-Bezerra é escritor, tradutor, crítico literário e professor de literatura.
É autor dos seguintes ensaios: Reverberações da fronteira em Horacio Quiroga (Humanitas/FAPESP, 2008) e Da clínica do desejo a sua escrita (Mercado de Letras/FAPESP, 2012); e das seguintes obras literárias: Histórias zoófilas e outras atrocidades (contos, EDUFSCar / Oitava Rima, 2013), Vertigens (poemas em prosa, Iluminuras, 2015, que recebeu o Prêmio Jabuti 2016) e O Pau do Brasil (poemas em prosa, Urutau, 2016).
Atua também como tradutor literário: traduziu autores latino-americanos como Horacio Quiroga (Contos da Selva, Cartas de um caçador, Contos de amor de loucura e de morte, todos pela Iluminuras) e Luis Gusmán (Pele e Osso, Os Outros, Hotel Éden, ambos pela Iluminuras). Sua tradução de Pele e Osso, de Luis Gusmán, foi finalista do Prêmio Jabuti 2010, na categoria Melhor tradução literária espanhol-português.
Como resenhista, atualmente colabora com O Estado de S. Paulo, O Globo e El Universal (México). É doutor em literatura comparada pela UERJ e mestre em literatura hispano-americana pela USP, onde também se graduou. É professor de Departamento de Letras da UFSCar, onde atua na graduação e no mestrado. Foi coordenador de cultura da UFSCar, de 2013 a 2016.
foto: Mariana Ignatios.
Os poemas a seguir foram selecionados do seu livro Vertigens (Iluminuras, 2015).
I.
O oxímoro dos seus seios vejo da fresta do meu
olho esquerdo, enquanto passa a página. Em
qualquer capítulo tateei para lhe saber as carnes.
Mas antes havia bulas, ditados das
professorinhas de redação, silêncio dos beats
preguiçosos, e um acróstico para suas joanetes.
O vento lança guardanapos. Gina mastiga, e eu
lhe sabia mais saborosa que feijoada em lata. Da
letargia de Gina segui adiante, a textura da
encadernação de cobra, seus movimentos, o
tilintar do brinco na minha língua, o fumegar da
cama, o trepidar do fósforo, e o que me faz
transpirar na testa ante o espelho que não vejo,
capítulo três ou capítulo quatro, a pior imagem,
prosseguia Gina, enquanto corrigia a vírgula e
me acentuava, quem foi que guardou a sua perna
que se abria, agora eu abro a página, não tem
figuras este livro tátil. Chega um cidadão assim
de curvado, pesa muito a sua moleira com
galinhas parnasianas da granja. Me oferece um
poema, criado com amor. Gina arrota, seu lábio
toca o dedo que toca o garfo que toca – nisso eu
me viro e vejo. A língua em que foi escrito eu
molho com uma saliva bêbada. Devora um
pouco da minha memória. O poeta necessário
tem um latifúndio produtor de imagens. Torro a
chama do pavio com o dedo, só por precaução.
E eu sempre soube, mas você me retrucava
notas contemporizando. No escuro, linguagem.
Sobretudo seus seios entre o livro. Não fosse a
tatuagem a língua não se excitaria. Peço outra
cerveja.